Toda e qualquer pessoa tem o direito e o dever de relatar um crime
presenciado contra um animal em qualquer delegacia de polícia. Segundo a
Lei Federal n. 9.605/98, dos Crimes Ambientais, a denúncia de
maus-tratos é anônima e proceder-se-á por meio de um Termo
Circunstanciado (semelhante a um B.O), uma vez que os animais são
considerados propriedade do Estado.
Abandonar animais domésticos É CRIME, porque expõe os mesmos a toda uma
variedade de circunstâncias que podem levá-los ao sofrimento, como fome,
sede, atropelamentos, doenças, espancamentos, envenenamentos, etc,...
Antes que você denuncie em uma delegacia algum mau trato, convido-o a
refletir sobre o que escreveu Rafael Teodoro, advogado e crítico de
música e literatura:
“Sempre considerei os maus tratos aos animais uma das piores atrocidades
que o ser humano pode cometer. Tanto que a morte da cadela Baleia,
narrada num dos capítulos do clássico “Vidas Secas”, foi para mim uma
experiência terrificante — ainda mais quando descrita pela pena de um
gênio como Graciliano Ramos.
Animais não podem defender-se sozinhos. Ficam reféns dos homens, da sua
crueldade. Nem mesmo entendem por que apanham. Veem o seu dono e pensam
logo em alguém que lhes há de dar amor, carinho, atenção. Que surpresa
desagradável, então, é levar uma bordoada, um chute ou qualquer outro
tipo de ataque. Quem bate não faz ideia de como sofre o animal. Quem
bate não percebe como, pouco a pouco, a agressividade contamina-o.
Não é preciso ser um especialista para intuir a covardia daquele que
maltrata um animal. Seja de que espécie for, a violência é censurável. É
covarde quem espanca um cão doméstico com uma vassoura, ou deixa o gato
a passar fome por miar demais. É igualmente covarde o dono do circo,
que deixa o leão preso na jaula — doente, a definhar — ou que adestra o
elefante espancando-o com uma vara de pau. Doméstico ou selvagem, pouco
importa: a violência contra os animais é inaceitável.
Penso nas leis e fico sabendo que o direito os considera meros objetos.
Mas que objetos são esses que nos trazem tanta alegria, tanta
felicidade? Quem alguma vez supôs que uma panela pudesse ser sua
companheira? Quem alguma vez viu um relógio abanar o rabo? E, no
entanto, é comum ver o sujeito que sevicia um animal dar um tratamento
de filho ao seu automóvel.
Por falar em carro, outro dia peguei uma carona com uma amiga. Saíamos
do trabalho. Eu a aviso para desviar do buraco: “Cuidado, pode empenar a
roda”. “Ah, nem me fala”, ela responde. “Já tive problemas demais
quando atropelei uma cadela a caminho da universidade.” Então a
interrompo antes que prossiga com a narrativa. Procuro mudar de assunto.
Finjo existir outro buraco. Não havia. Queria mesmo era impedi-la de
dizer-me os detalhes; recusava-me, por julgar demasiado doloroso, a
imaginar o atropelamento. Quantos cães e gatos são atropelados todos os
dias no trânsito violento do nosso País? Essa é uma estatística
inexistente. Porque animais são objetos — e objetos são descartáveis.
Podem ser para o direito e suas frias leis. Não o são para mim.
Mas o agressor de um animal não é apenas um covarde. É também um
potencial criminoso. Pelo menos é o que revela a pesquisa feita pelo
chefe de operações da Polícia Militar Ambiental de São Paulo, capitão
Marcelo Robis Nassaro. Em sua dissertação de mestrado, ele analisou os
dados daqueles que foram autuados por maus-tratos a animais. Descobriu
então que muitos dos agressores haviam se envolvido em outros crimes. Na
verdade, seu estudo inspirou-se noutro, realizado nos Estados Unidos,
quando pesquisadores constataram que serial killers registravam em comum
um histórico de agressão a animais.
No Brasil, há exemplos emblemáticos de violência contra os bichos.
Tivemos o caso da enfermeira que espancou seu cachorro da raça Yorkshire
até a morte. Tivemos também o caso do prefeito de Santa Cruz do Arari,
no Pará, que autorizou o extermínio dos cães da cidade, o que era feito
da maneira mais cruenta possível. E o que dizer dos assassinatos de
touros neste evento estúpido que atende pelo nome de tourada? Que dizer
das festas de peão, com rodeios promovidos à custa da sevícia de bois e
cavalos?
No fim, a lição que fica das pesquisas, bem assim dos tristes exemplos
que recordei, é uma só: as agressões contra os animais constituem o
primeiro estágio na escalada do crime. Quem põe um galo para brigar até a
morte numa rinha, quem quebra as asas de uma ave, quem fustiga um
jumento com o junco está a um passo da mesma covardia que acomete aquele
que espanca uma mulher, que sevicia uma criança, que toma em mãos um
revólver disposto a matar. Em todos esses casos, sobra sangue frio,
falta respeito à vida. A violência é a mesma”.
(Jornal de Luzilândia)
Por Miguel Dias Pinheiro, advogado